Posso mudar meu nome?
O nome de cada indivíduo é um verdadeiro direito, resguardado pela nossa legislação civil. Muito além meramente servir para identificar a pessoa perante a sociedade, o nome traz consigo toda uma história familiar, permitindo a terceiros conhecer, de antemão, muito sobre aquele que o possui.
Compõe-se, assim, a identificação da pessoa de um nome (simples ou composto – exs: José, José Augusto), este também chamado de prenome, seguido de um sobrenome, também chamado de apelido, nome de família, cognome ou patronímico (exs.: da Silva, Pereira de Souza).
Diante da sua importância, a Lei de Registros Públicos (6.015/73) determina, como regra geral, que este será imutável, mas, reconhece a possibilidade de exceções considerando situações específicas, devendo as retificações serem feitas fundamentadamente, sempre através de ações judiciais.
Vale aqui diferenciar a retificação/alteração do nome (correção por erros), da chamada averbação, que ocorrerá com o casamento da pessoa, ou com seu divórcio. No caso dos nomes registrados com erros ortográficos, não é sequer necessário o ingresso nas vias judiciais, podendo ser realizado pedido escrito perante ao cartório competente, conforme disposição do artigo 110 da Lei de Registros Públicos.
Talvez a hipótese mais conhecida da retificação do nome seja nas situações em que este exponha seu portador ao ridículo, ao vexame, causando constrangimento. O art. 55 da supracitada lei, na verdade, já estabelece que os oficiais de Registro Civil não podem registrar prenomes que enquadrassem-se neste tipo de situação.
Noutra hipótese permissiva, a alteração do nome poderá se dar para a inclusão de apelido público notório, conforme permite o art. 58 da citada legislação. Esta situação pôde ser vislumbrada quando a apresentadora de TV Maria das Graças Meneguel adotou o apelido público “XUXA”, passando a chamar-se Maria das Graças Xuxa Meneguel.
O pedido de modificação também poderá ser feito quando existir grande quantidade de homônimos, visando individualizar o sujeito dos demais (ex.: José da Silva).
Preocupado com a situação das vítimas e testemunhas de crimes, que constantemente são ameaçadas e coagidas em decorrência de sua colaboração judicial, o legislador dispôs sobre a possibilidade de alteração do nome no parágrafo único do artigo 58 da Lei de Registros Públicos.
Com relação à adoção, visando a inserção da criança no novo seio familiar, o artigo 47, §5º do estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê a inclusão do sobrenome do adotante, e, até mesmo, estabelece a possibilidade da alteração do prenome e a supressão do sobrenome dos pais biológicos.
Também vem sendo admitida em nossa jurisprudência pátria a alteração do nome de estrangeiros, visando facilitar sua pronúncia ou garantir harmonia ao conjunto. Tal situação é rara e necessita de ampla discussão judicial para seu deferimento, diferindo-se um pouco do pedido de tradução ou adaptação do nome à língua portuguesa nos casos dos processos de naturalização, hipótese prevista no parágrafo primeiro do artigo 71 da Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017).
Vale destaque a polêmica questão da alteração do registro civil de transexuais, objeto de discussão constante em todas as instâncias de nosso Poder Judiciário. Recentemente o Superior Tribunal de Justiça decidiu[1], em um caso específico, pela possibilidade da alteração tanto do prenome quando do gênero constantes no assentamento civil de um transexual, mesmo sem que este tenha realizado a cirurgia de mudança de sexo. Esta decisão criou um importante precedente sobre o tema, mas não necessariamente impõe que todos os demais tribunais adotem este mesmo entendimento para todos os casos. Nestes casos, o que comumente se vê é que os tribunais tentam adequar o assentamento civil a realidade fática externada perante a sociedade, reconhecendo formalmente o que visivelmente já era reconhecido socialmente.
Fugindo à regra, o único meio de alteração do nome sem a necessidade de fundamentação para tanto, está prevista no art. 56 da Lei de Registros Públicos, que prevê que, independentemente de justificação, poderá o interessado alterar seu nome, desde que não prejudique o sobrenome e a terceiros, na fluência do primeiro ano após a maioridade civil (dos 18 anos aos 19 anos).
Diante de todo o exposto, ficou evidente a existência de diversos fundamentos que permitem a alteração do assentamento civil de uma pessoa. Cada caso, contudo, tem suas peculiaridades e necessita análise minuciosa já que, em grande maioria, o pedido envolverá a propositura de ação judicial para ser viabilizado. Tais ações podem tornar-se complexas, exigindo cautela e conhecimento para que se atinja os objetivos esperados.
[1] REsp 1626739/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 09/05/2017, DJe 01/08/2017